terça-feira, 30 de dezembro de 2008

HAI TROPIKAI
ALICE RUIZ - PAULO LEMINSKI
1985

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Foi Morar no Mar

Recolhidas, as conchas,
medi
a terra
de novo;
Mediterrâneo.

Viu? Quantos palmos tem?
- Contei mas perdi no meio. Quem pergunta?
Não me conhece?
- Taí faz tempo?
Tempo suficiente.
- H'm, e o que viu?
O clima mediterrâneo tem médias térmicas superiores a 18°C.

Mergulhei no blues
e trouxe de volta
o meu vento de outrora.
Reconheci
o segredo em teus olhos,
a sua música.

domingo, 30 de novembro de 2008

Silêncio, Por Favor

Tem tempos em que o que a gente só quer
é silêncio
Ontem foi um dia desses
Tempos de silêncio e des-silêncios,
é o infinito
Daí, no caminho,
você encontra pessoas que,
ora te fecham ora te abrem os olhos
São nesses intervalos,
de ritmar de pálpebras,
que você vê a beleza.

À Daniela Dams

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Mais com mais mais
Mais com menos menos
Menos com mais menos
Menos com menos mais
Mais do mesm0,
tinha até uma canção.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

De um dia atrás do outro

E que se visto do alto é muito maior a dimensionar o reduzido. Maior do que se pensa e menor a equivaler uma partícula de átomo. O toque escapole, escorrega. Não bastam equilíbrio e delicadeza, é preciso chegar de perto, ouvir o que dá pra sentir. E que em cada continente um hemisfério, um país, uma cidade, um bairro, uma rua que caminha pela calçada de nossos olhos. Enxergar é pouco ao costume da vista. Em cada esquina de rua pulsa um pedaço de tudo, tudo já conhecido até então. Pouco? Pedaço é fatia de bolo de aniversário, que, em fragmentos de junção de farinha de trigo, açucar e outros ingredientes mais dividem-se, compartilham entre si a característica. Os anos passam mas não repassam, a propriedade do tempo é única.
Por aqui o sol alumeia, os carros passam e a vida avança a cada fatia de bolo notada.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Depois que conheci a minha, descobri que mãe é tudo igual. Mas isso é bom!

terça-feira, 8 de julho de 2008

Sinto
por quê?
Basta!
Sinto
porque
assim
basta.
Até amanhã.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Quem Gosta de Gatos?

Examinava furtivamente pela janela do quarto que deixara aberta a fim de identificar o dia, que já era noite. Ali, em cujo estado corporal deitada estava e que só alternava a posição das pernas às vezes, espreitava o lado de fora a constatar o tempo. Teimava um olhar alheio a observá-la rígida e em todos os detalhes.
Escancarou a janela, olhou fixo para um lugar como quem soubesse exatamente o que procura. Inclinou o corpo acompanhado do impulso do olhar, para frente e para baixo, ao mesmo tempo. Em seguida, olhou em toda a volta. Acendeu um cigarro.
Lúcia sempre que sentia-se muda em relação a si burlava a racionalidade. Ela dizia que o importante é sentir não importando o quê. E que todo o resto é bobagem.
Lúcia não tinha namorado. Na verdade, nunca namorou.
Enquanto deixara o cigarro queimar lentamente entre os dedos, raramente levando-o a boca, tragava qualquer desejo de acontecimento. - olhava para os lados.
Quando criança, Lúcia vigiava-se no espelho por inúmeras vezes ao dia, a boca antes pintada de vermelho tinha de dispor o propósito da vitalidade da cor. Retocava os lábios a todo o momento. Lia palavras difíceis bem de frente ao seu reflexo, encenava caras e bocas. A escolha das palavras se dava pela sonoridade que elas emitiam ao serem entonadas. A entonação fazia toda a diferença. E aquele batonzão cubria-lhe com alguma veracidade a tentativa de apontar a idade que não tinha.
Lia e fazia poses, algumas sensuais. Sua mãe adorava dizer para quem quisesse ouvir que era menina engajada e que tinha futuro. Chegou a levá-los quando criança, ela e o irmão, num desses estúdios caça talentos. Lúcia nunca falou com a mãe a respeito e nem com mais ninguém, mesmo depois de grande. Também não disse que não gostava, era de seu agrado conhecer lugares novos, principalmente os frenquentados por adultos.
No início da madrugada, Lúcia observou a lua e a luz forte que vinha do alto em direção a todo o resto. Retornou e retomou o olhar ao horizonte do emaranhado de casas até à ponte Rio-Niterói.
Antes mesmo que voltara a deitar-se, conservou a abertura de fresta a espiar pelo pequeno espaço; notara que há horas, em cima do muro, havia um bichano, e que este estava no mesmíssimo lugar e posição de quando abrira a janela pela primeira vez. Lá estava ele, do outro lado da rua. Fitando-a. Era ele, o tempo todo.
Nem sabia, mas gostava de gatos.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Mônica Helena, a louca

Eu seria uma boa inquilina se fosse habitante dessa sua sexualidade imunda. Lambo-lhe o dia com a ardência do cotidiano e com a possibilidade de encontrar tua poesia na cozinha. É suja e grotesca.
Você, quando não oscila da conveniência à falsa honestidade, senta-se descaradamente entre uma e outra de modo a cruzar as pernas olhando no meínho da bola castanho escuro do meu olho, à espera de qualquer advertência de silêncio de como quem olha e diz: "h'm, tá."
Vênuns e oxum são nada perto da malemolência que exala desta pele invisível. Das palavras expulsas de sua boca, muitas destas se perderam aleatórias no espaço físico do afazer corriqueiro.
Toda manhã ela comia granola com a mão e leite misturado a uma quantidade razoável de achocolatado. Tinha horror a engordar. Certamente fôra gorda na infância ou exclusa em algum momento pela notoriedade da loucura. Misteriosamente o interesse em desvendar a sua loucura aqui é nulo.
Era de um ou no máximo dois amigos, mas muitos contatos. Contatos estranhos, diga-se de passagem. Não é que as pessoas do círculo de contatos fossem estranhas, a maneira de como as conheceu é que ela fazia questão de dizer o quão floreado foi. Eu gostava de ouvir até certa época, era engraçado.
Culta, viajada e inteligente do tipo que beira à maleficidade de um cérebro carteziano, previsível e de matrizes maldosas. Feminista de carteira, cuja a tentativa de oposição neste caso é cômica.
A mesquinharia lhe invadia a alma de tal forma a não identificar o humano que se escondia dentro de si.
O silogismo é muito maior e peculiar. Não posso tencionar veneta ou evocar alguma intenção secreta, pois não há.
Portanto, adeus Mônica Helena.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Medo de Voar

Sinto-me o mínimo a vontade que alguém possa querer (estar). Em contraponto, me ponho a fazer, mas como se não fosse a única preocupação d'agora. Me preocupo, no entanto, também, na recolha do lixo que esbanja no transbordar da borda cercada dum banheiro de luz mofada. O que nada é. No mais, me preocupo que, logo, ao amanhecer da noite repulsada de meu olho, não posso esquecer. Ou fingir esquecer o que não tenho feito. Preciso fazer supermercado.
Fôra, passo dado, lixo recolhido, dentes escovados, a água jogada no rosto, gotas d'água - dessas, pôde sentir as fugidas escorrerem pelos braços até as pontas dos cotovelos. Suficiente a secar-se. Secara o rosto, voltou-se contra ela e acordou-a. Ajudou. Espaireceu o anterior, parece, e nem se deu ao trabalho de acordá-la. Fiz, apenas levantei.
No primeiro contato, não considero este o primeiro: apreensão faltou. Bom ou ruim? Vamos, há um dia todo pela frente. E, quem diria que, ao sair do prédio e se propor à luz, que cega, ela receberia um convite, um soberbo convite, - me permito demonstrá-la dessa forma tão, tão... familiar e como se não, ao avesso. Posso sentir a verdade ecoar, o organismo dela pulsa. Sempre me pedira isso. É até fantasioso. - convite a voar.
Foi-se a voar, jamais recusaria. Sentir o vento nas entranhas era o que mais te excitava. Já houvera feito antes. No entanto há tempos não sentia o estremecido da pele. O durante estendeu-se por mais..., aproximadamente três minutos. Era o fim, se aproximava. Temia, mas não pensava. Só sentia.
O querer formou-se depois. Teria querido, se quisesse. Mas não era a hora. Contornar a paisagem em âmbito de flor era sem graça. Sua ganância não era sequer maliciosa.
O aflito movimento das asas remanchava ao vento, fizera o esforço da volta para depositá-la de onde a tirou. A ave a incomodava. Foi então que, num instante de desatenção da ave, ela se soltou e saltou. Abriu as asas, as próprias. Pousou. Tal como se pousa leve num regato de asfalto. Como é possível?! O limitar da guia, do aterramento, da ciclovia? Voltara a cegar-se. Voltara a cegar-se. Pela íris sua, contrapunha todas as luzes que nunca teria querido ver e cores que haveria querido tocar. Ter e querer vão de pesares incomuns. E o que importa já que as tinha?
Pouco antes que o pouso forçado acontecesse, num dejavu, apeou o corpo a enganar o vento. Revirou-se. E com um movimento brusco bateu as asas com força. Força essa descabida, que nunca tivera. Voou por toda a orla que poderia ver a olho nu, de uma praia à outra, e outra, e outra. O cheiro de peixe das pontas das praias lhe agradava. Queria chegar sempre às pontas e recomeçar dali, para a mais próxima, o início da outra praia. O recomeço. Almejava o recomeço. Ela sempre soubera, mas fingia, lhe doía.
Ao fim da orla, dera meia-volta e pôs-se a fazer tudo, sentir tudo, desde o início.